Apostas para o Réveillon – o Tudo ou Nada televisivo

No panorama televisivo nacional, como se sabe, tudo vale quando se fala em sucesso audiométrico. As estações generalistas tentam à força apresentar formatos irreverentes, acessíveis a todos os públicos e sabem as suas administrações que com as escolhas certas, grandes audiências são garantidas.

Por um lado, é esta competitividade que dá brilho à televisão. Cada canal tenta ao máximo agradar o telespectador, custe o que custar. Por outro, correm-se riscos (necessários?) com conteúdos polémicos, brejeiros e de parco nível cultural, demonstrando uma enorme falta de recursos e, vou mais longe, uma cisão na ética televisiva.

Adiante.

O calendário televisivo divide-se, grosso modo, em três partes. O primeiro correspondente aos meses de Setembro-Dezembro, seguindo-se o período Janeiro-Abril, terminando o ciclo televisivo com a época de Maio-Agosto. De facto, se atentarmos à programação dos canais generalistas, conseguimos elencar uma linha orientadora dos conteúdos transmitidos. Uma grande aposta de exteriores no período de verão, formatos de teste ou extensões de edição na segunda estação e grandes estreias na época de Setembro-Dezembro, são elucidativos exemplos da calendarização televisiva.

Contudo, as preocupações comerciais das emissoras nacionais ganham uma nova escala, naquela que é, por excelência, a noite mais aguardada do ano: O Réveillon! É sobretudo para saírem vencedoras desta noite que as generalistas trabalham arduamente na época Setembro-Dezembro, investindo milhares nos melhores formatos internacionais, gastando outros tantos em publicidade e, se for o caso, reservando as maiores salas de espectáculos do país para de lá serem conduzidas as emissões na noite de passagem de ano. A diferença entre ganhar ou perder no Réveillon pode salvar ou comprometer um ano inteiro de esforço.

É nesta lógica que irei, de seguida, apreciar as escolhas de fim de ano que têm sido tomadas pelas três estações generalistas, indagando, sem prejuízo de errar, que resultados obterão no dia em que receberemos 2014. Isto, sem claro esquecer de esclarecer quais seriam, ousando ser director de programação por um dia, as minhas opções.

gatofedorentoEm primeiro lugar, a RTP. Nos últimos anos, a televisão pública tem apostado forte na noite de trinta e um de Dezembro. Porém, sempre em formatos semelhantes, opção incongruente visto não se poder invocar a máxima de que ‘’em equipa vencedora não se mexe’’. Aliás, perde sempre, ano após ano. Lembro-me até, nostalgicamente, do Réveillon de 2007-2008, com a emissão do especial ‘’Diz que é uma espécie de réveillon’’ dos Gato Fedorento, que prometia surpreender e mesmo assim não foi além do já costumeiro terceiro lugar. Valeu o quarteto de humoristas, o Pavilhão Atlântico e a Sabrina Salerno. De resto, como sempre, saiu vencedor o Casamento de Sonho da TVI, seguido da Família Superstar da SIC. No entanto, importa dizer, a RTP esteve à tangente do segundo lugar. Dois anos mais tarde, em 2010, o especial de fim de ano da ‘’velha emissora’’ não foi além dos 16,6% de share, valor que colocou a ‘’Gala das Galas’’ fora do top 15 dos programas mais vistos desse dia, consagrando o fracasso da estação do estado em matéria de programação de fim de ano e desonrando o esforço dos Gatos. A partir de então, a RTP desceu o valor médio de audiências da ‘’noite mágica’’ a pique, registando no ano passado um dos piores resultados de sempre com o programa ‘’13 Badaladas’’, conduzido por Herman José.

Contudo, e mantendo a linha ideológica que tenho defendido, a RTP pouco tem a provar, direccionando a sua programação a um público fidelizado, de elevada faixa etária, que acompanha o canal muito pela manutenção de um certo decoro e conservadorismo que a mesma apresenta nos conteúdos de horário nobre, ainda (e ainda bem)!

Sem notícias da aposta pública para o olá a 2014 e sem querer acertar, uma emissão especial de Breviário Biltre ou uma gala temática ‘’na onda’’ de Bem-vindos a Beirais, embora não garantissem (de forma alguma) uma vitória, trariam conforto audiométrico e sobretudo sensação de ‘’dever cumprido’’ à emissora estatal.

idolosNo segundo posto, a SIC. Já lá vai (atentem no recurso à expressão popular) o tempo em que a SIC nos presenteava com bom entretenimento. É, de facto, uma realidade distante. Sem contar com as primeiras edições de ‘’Ídolos’’ ou do mítico ‘’Chuva de Estrelas’’, apenas em 2007-2008 (data já referida em relação à RTP) a estação do grupo Impresa fez justiça ao talento dos seus profissionais, com a emissão da final do formato ‘’Família Superstar’’. Sem atender ao duvidoso casting deste programa familiar, os resultados foram os esperados. Um bom segundo lugar, mesmo que com a RTP à espreita. Todavia, não estou certo que o sucesso de audiências do programa apresentado por Bárbara Guimarães tenha mérito próprio (2007 foi o ano dos horrores da TVI, com ‘’Casamento de Sonho’’ a afirmar-se como a grande aposta da estação de Queluz e que, infelizmente, ganhou!).

secretstory3casadossegredosNos anos seguintes, a SIC perdeu todas as possibilidades de ganhar o prime-time de fim de ano com apostas tão bem produzidas quanto a casa assombrada da Feira Popular. Um autêntico desastre para a estação de Carnaxide, que levou a terceira e quarta edições de ‘’Ídolos’’ a serem completamente ceifadas pela terceira edição do ‘’Uma Canção Para Ti’’ (2009-2010) e pela primeira da ‘’Casa dos Segredos’’ (2010-2011). Em relação a 2012-2013, a emissora de Pinto Balsemão ousou em pôr no ar o programa ‘’Toca a Mexer’’ como concorrente direto da ‘’Casa dos Segredos III’’, tendo alcançado uma derrota histórica. Desta vez, o formato conduzido novamente por Bárbara Guimarães não só se ficou apenas pelo 15º lugar do dia como nem sequer figurou no top 5 dos mais vistos do próprio canal. Vergonhoso para uma estação que se quer afirmar líder de audiências.

Não obstante aos hediondos resultados dos últimos tempos, o canal três da grelha nacional pode contar, certamente, com um cómodo resultado de ‘’Fator X’’, que aliás tem triunfado no horário nobre de domingo e que apesar de não se apresentar dia 31 com a Final, promete uma emissão estrondosa, a cargo de João Manzarra e da prata da casa, está claro, Bárbara Guimarães. Quanto a sair vencedor na entrada para o novo ano, muito dependerá do desempenho da TVI.

The last but not the least, a TVI. Em Queluz há muito que não se perde um Réveillon. Ligada à Endemol desde os seus primórdios, a estação criada em berço cristão tem feito as escolhas acertadas, colocando-se num pedestal televisivo que até hoje nenhuma outra emissora ousou pegar de caras. Desvalorizando o ano de 2007, cujo incidente já foi explicitado, a antiga ‘’4’’ tem demonstrado ao público português o verdadeiro significado da expressão ‘’soma e segue’’. Desde as intemporais edições de ‘’Big Brother’’, ao projecto da ‘’Quinta das Celebridades’’, ‘’1ª Companhia’’ ou ‘’Canta Por Mim’’, a TVI regista, desde 2008 com o ‘’Uma Canção Para Ti I’’, números incríveis quando de audiências se fala. Com a chegada do formato ‘’Secret Story’’ (2010-2013/2014), pelas mãos de Júlia Pinheiro, a TVI consolida uma liderança que levará uma boa fatia de tempo (e muito dinheiro) a desconstruir.

Ainda assim, quanto à programação deste ano, eis que Luís Cunha Velho (Director da TVI) – ora para ‘’trocar as voltas à concorrência’’ ora sabe-se lá porquê – vem a público dizer que ‘’ainda não é certo que a passagem de ano da TVI seja com a final da ‘’Casa dos Segredos IV’’, acrescentando que a estação do grupo Media Capital está a estudar a hipótese de prolongar o programa de Teresa Guilherme até à data da final do ‘’Fator X’’, o que no meu pensar constituirá uma má jogada por parte da emissora de Queluz. Com a final do ‘’Secret Story’’ no dia 31 de Dezembro a TVI tem praticamente garantida a vitória, mesmo com concorrência apertada. Adiar, só fará com que provavelmente perca na noite de fim de ano e volte a perder na coincidência das duas finais. Aqui sim, é caso para repetir o dito: ‘’equipa que ganha não se mexe’’.

Concluindo, mostra-se então que pelo enésimo ano consecutivo as apostas televisivas para o Réveillon são minuciosamente pensadas e secretamente guardadas até à última, fazendo desta data uma verdadeira festa também televisiva, sempre recheada de surpresas. Para este ano, há que destacar a misteriosa opção da RTP (como referido acima, ainda não foi divulgada), a aposta milionária (basta ver o valor do prémio) da SIC com um talent-show de reconhecimento internacional e a indecisão da TVI em prolongar um formato com muitos anos de provas dadas. Quem ganhará? É ver para crer!

Nota: Esta crónica tem apenas em conta as informações divulgadas pelos intervenientes até ao dia 30 de Novembro de 2013.

Crónica de João Morais do Carmo