Escândalos – Nuno Araújo

“Escândalos”

2013 começa com temas “quentes”: no Vaticano já não se pode pagar nada com cartão, por proibição do Banco Central de Itália. Cavaco promulgou o orçamento de estado, para logo depois o Tribunal de contas revelar, num estudo, que “não existe evidência de que as despesas de funcionamento dos gabinetes dos membros do Governo tenham diminuído”. Mais achas para a fogueira: o governo decidiu nacionalizar, temporariamente, o BANIF, por risco de falência a médio prazo. Enquanto milhões de portugueses não conseguem pagar todas as suas contas, parecem haver ainda ministros a esbanjar fortunas em destinos de férias paradísiacos…há aqui algo profundamente errado, não?

Cavaco e o orçamento de estado para 2013 (OE 2013)

O Presidente da República Portuguesa, Aníbal Cavaco Silva, promulgou o OE 2013. Contudo, pediu ao Tribunal Constitucional (TC) a fiscalização de três normas do Orçamento, normas essas relativas à suspensão do pagamento do subsídio de férias (em geral e para aposentados e reformados) e à contribuição extraordinária de solidariedade. Não se podia esperar mais, isto vindo de um presidente intimamente ligado ao governo PSD-CDS e às políticas de austeridade que vêm destruindo a economias e as pessoas em Portugal.


Com efeito, as três normas que Cavaco solicitou ao TC para fiscalizar são “curtas” para se poder afirmar um desencontro entre o Presidente e as políticas deste governo, tratando-se, isso sim, de questões de pormenor. O essencial das políticas de ataque à classe média e aos trabalhadores, assim como aos desempregados, é partilhado por Cavaco e Passos Coelho.

Note-se, sobretudo, a contradição de Cavco: fala de um orçamento que acentua a “espiral recessiva”, mas diz que Portugal vai crescer economicamente este ano…então, em que ficamos, afinal?

O PS já pediu, tal como se lhe exigia, a fiscalização prioritária do orçamento, ou seja, com carácter de urgência. Este orçamento nunca poderia ter entrado em vigor, pois é o pior orçamento desde 1975. Portugal necessita de um orçamento que não penalize mais os portugueses, mas que corte a despesa do estado, sobretudo em “excessos ministeriais” com despesas correntes, não nas despesas sociais.

Nacionalização temporária do BANIF, ou a “mãozinha invisível do governo”

Começo com uma pergunta: Dr. Vítor Gaspar, o BANIF será um novo BPN? Esperemos bem que não!

O BANIF vai ter uma injecção de capital estatal (público, logo de todos nós) na ordem dos 1100 milhões de euros. Esta nacionalização é temporária, e destina-se a reequilibrar as contas do banco.

Depois de investimentos mal calculados, e após o falecimento de Horácio Roque, histórico presidente do BANIF, que o banco insular tem estado na “corda bamba” dos mercados de capitais. A especulação fez o pequeno banco “abanar”, banco esse que se dedica, acima de tudo, a gerir (poucas) grandes fortunas. O BANIF detém uma seguradora, e algumas agências internacionais gestoras de fundos de investimento.

Ora, na necessidade de recapitalização da banca, o estado cobre o que a Troika exigiu, um rácio de capital, de solvabilidade, suficiente para um banco não se tornar um “banco mau”, com os chamados “activos tóxicos”. É aqui que o BANIF precisou de uma “mãozinha invisível” do estado, não para regular o sector financeiro, mas sim para salvar um banco “em aflição”.

Não se compreende porque é que o governo ajuda um banco, quando impõe austeridade cega e quase sem limites aos portugueses. É tremendamente injusto isto estar a acontecer.

O BANIF, refém da falta de capital da família Roque e da falta de garantias bancárias dos anteriores accionistas, fica agora refém da vontade do estado português, que com quase 100 % do capital, pode gerir o banco como quiser e até nomear administradores. Mas estas condições não dizem nada de bom aos portugueses, pois o que os portugueses querem saber é se a injecção de 1100 milhões de euros do erário público no BANIF sairá muito mais cara, tal como aconteceu com o BPN, que continua a acumular prejuízos para sucessivos orçamentos de estado de anos vindouros. Porque a verdade é que só o estado é que corre riscos em operações como esta, dado o tipo de sistema bancário em que o mundo ocidental persiste em fazer negócios.

Alterações de taxa de IRC

O governo ambiciona mudanças na aplicação de taxas de IRC, e prepara-se para fazer alterações em breve. O IRC, que está neste momento em 25%, pode vir a descer até aos 10%.Vítor Gaspar afirmou pretender “o alargamento da base tributária e uma redução efetiva das taxas aplicáveis”. Isto significa cobrar impostos a mais agentes económicos, e reduzir montantes cobrados. Com tudo isto, devemos colocar algumas questões: qual o alcance desta medida? Será que o governo pretende baixar os impostos pagos pelas empresas, aliviando-as desse fardo? E, se as empresas pagam menos impostos em tempos de austeridade, quem pagará essa “folga”? Ou será que o governo pretende obter, por outro lado, mais dinheiro em impostos?


Para responder a estas questões, o “especialista” António Lobo Xavier foi nomeado pelo governo para estudar, com mais nove “especialistas”, alterações no IRC. Faltando ainda saber qual o alcance destas alterações na taxa de IRC, deveríamos saber, já agora, qual a verba que o governo irá dispender para Lobo Xavier e restantes “especialistas” elaborarem esse estudo para o IRC.

Lei das indemnizações por despedimento

O governo aprovou, em conselho de ministros, uma proposta de lei que reduz para 12 dias por ano de trabalho a base de cálculo para as indemnizações por despedimento. Uma lei que penaliza os trabalhadores, uma vez mais. A lei em causa ataca, e de que maneira, direitos constitucionais de milhares de trabalhadores, abrindo caminho a que o patronato possa despedir, “do pé para a mão”, trabalhadores com dezenas de anos “de casa”, indemnizando-o com “meia-dúzia de tostões”.

Esta lei foi elaborada, mais uma vez, sem ter tido em conta a opinião dos parceiros sociais, como UGT ou CGTP. Ora, se Passos Coelho prometeu não menosprezar a concertação social, porque razão é que mais uma lei passa sem auscultar ninguém da oposição? Talvez porque Passos é cada vez mais parte do problema, e não parte da solução.

Portugal desce para 9º lugar no “Clube da bancarrota”

O chamado “clube da bancarrota” é um top ten compilado e pontuado pela empresa financeira CMA Datavision, que analisa as dívidas soberanas e respectivas percentagens sobre probabilidade de bancarrota dos países do mundo. Ora, num ranking onde o que é bom é nem sequer lá constar, a posição de Portugal no 9º lugar reveste-se da maior importância. Portugal está, tal como eu tenho dito em crónicas anteriores, prestes a sair do espectro da especulação bolsista com a dívida soberana, em que 29% de probalilidade de bancarrota está muito perto dos 25% de Itália ou Espanha.

Sejamos justos, Portugal consegue livrar-se do fardo da especulação com a sua dívida soberana muito por força do apoio de Merkel a Portugal, mas também pela intervenção de Mario Draghi, presidente do BCE, em garantir a compra de dívida soberana em mercados secundários, o que salvou o Euro. Merkel salvou ainda a Grécia, não a deixando cair num marasmo financeiro, o que contaminou positivamente Portugal.

Sou um democrata, mas concordando ou não com a forma como Mario Monti entrou para o cargo de primeiro-ministro em Itália, há que dizer que Itália se conseguiu passar pela “tempestade” da dívida soberana muito melhor desde a mudança de líder do governo italiano. E isso valeu a Espanha a parca necessidade de pedir assistência financeira para os seus bancos, e não para os cofres públicos.

Como Portugal tem a crise da dívida soberana sobre controlo, justifica-se uma mudança de políticas e de políticos no executivo governamental. Em Portugal é tempo de fazer a economia crescer, criando emprego, baixando impostos sobre o consumo sobre artigos não luxuosos, devendo haver descida generalizada de IVA, devolvendo todos os subsídios de férias e natal retidos pelo governo, impedindo a subida do IMI, congelando o aumento da água, luz e gás, para além de ser imperioso deter igualmente os aumentos nos transportes. Aumentando o salário mínimo poder-se-ia repôr alguma justiça no quotidiano económico do país, pois um salário de 500 euros em Portugal, com o custo de vida actual, está longe de ser bastante para alguém garantir a sua sobrevivência.

Aplicar impostos mais altos sobre quem mais ganha é o mais justo em tempo de crise económica, pois quando se aplica mais impostos na camada média da população, o consumo decresce e a economia entra em queda, como é o caso português.

Pagamentos electrónicos suspensos no Vaticano

O Vaticano deixou de ter disponíveis meios de pagamentos via electrónica, devido a falhas no combate ao branqueamento de capitais, isto de acordo com a leis em vigor na UE. O banco central de Itália, assim, retirou a licença, cuja responsabilidade estava a cargo do Deutsche Bank de Itália. Ou melhor: o Deutsche Bank, que não tinha sequer licença para operar no Vaticano, onde agia desde 1997, viu recusado o pedido para operar nesse micro-estado.

A Moneyval, agência da UE que supervisiona a actividade financeira em solo europeu, tinha relatado, no ano passado, que a Santa Sé e o seu Instituto de Obras Religiosas (IOR) se esforçavam, mas não o suficiente, para mostrar transparência aos mercados de capitais. Ao que parece, o Vaticano não dispunha de instrumentos para monitorizar eventuais lavagens de dinheiro. A instituição da UE, liderada pelo russo Vladimir Nechaev, referiu que o Vaticano continua a não se adaptar às regras europeias, logo o Vaticano continua fora da lista que inclui os países cumpridores das leis europeias.

Enquanto o Vaticano procura um banco parceiro fora de Itália, só vai sendo aceite dinheiro vivo dentro do Vaticano.

Esta situação causa, desde já, perdas significativas no plano financeiro, para o micro-estado liderado por Papa bento XVI (ou Joseph Ratzinger), pois em 2012 mais de 5 milhões de turistas visitaram o reduto da praça de S. Pedro, e lá gastaram cerca de 90 milhões de euros em bilhetes e souvenirs.

Esta situação não abona a favor do Vaticano, que vê as acusações que lhe são feitas de falta de transparência financeira subirem de tom, pois já em 1982 Roberto Calvi, o “banqueiro de Deus”, líder do Banco Ambrosiano, foi encontrado enforcado sob a Ponte Blackfriars em Londres.

Falando da falência do Banco Ambrosiano, entidade ligada ao Vaticano, o fio do novelo continua, se nos reportarmos à situação do P2 (Propaganda 2), situação essa que em Itália causou um grande “reboliço” na área da política e da alta finança. Alegadamente, 1200 milhões de dólares (moeda italiana à época) faltariam nos cofres do referido banco, devido a empréstimos a “descoberto”, isto é, não passíveis de serem saldados.

Em 1987, dois administradores do IOR, Luigi Mennini e Pellegrino Strobel, e o arcebispo Paul Marcinkus, foram considerados culpados de vários crimes de fraude financeira. No entanto, e depois de uma “caça ao homem” efectuada pela polícia italiana, o arcebispo e os dois administradores do IOR obtiveram asilo dipolmático junto do Vaticano, que os veio a considerar inocentes.

Num escândalo que quase fez desmoronar grande parte do sector financeiro internacional, a saída foi a fusão entre o Banco Ambrosiano e o Banco Católico do Veneto. O Papa João Paulo II nomeou outros administradores para o IOR, laicos e com experiência e financeira comprovada.

A morte do Papa João Paulo I, que apenas esteve no cargo papal durante 33 dias, também se pode ter devido à acção da chamada P2. As várias e inconsistentes declarações que se seguiram ao falecimento do Papa alimentaram várias teses conspirativas, sendo que uma delas se prende com a alegada descoberta, pela parte do Papa João Paulo I, de vários crimes financeiros dentro do Vaticano. A mesma freira costumava acordar o Papa João Paulo I todas as manhãs, mas, e apesar de se explicar oficialmente o óbito por enfarte do miocárdio (devido à pressão excessiva exercida sobre o sumo pontífice), a verdade é que essa freira fez um voto de silêncio.

O paradeiro desses 1200 milhões de euros continua a ser desconhecido, assim como as causas inequívocas que explicam a morte do Papa João Paulo I.

 

Crónica de Nuno Araújo
Da Ocidental Praia Lusitana