Lágrimas, baba e ranho – Laura Paiva

Não sou criatura de lágrima fácil. Digamos que carpir não poderia ser a minha actividade profissional. Contam-se, pelos dedos de uma mão, as situações de descontrolo total com ida às lágrimas. Com baba e ranho, serão ainda menos. Seria de pensar que sou insensível, com um coração de pedra ou que talvez tenha o saco lacrimal furado.

Mas não, não é nenhuma dessas hipóteses. O que acontece é que me comovem mais facilmente as histórias dos outros – reais ou mesmo fictícias – principalmente se envolvem crianças, animais ou lições de vida.

Há uns anos atrás, a leitura de um livro provocou em mim um dilúvio de proporções bíblicas – O diário da nossa paixão de Nicholas Sparks. Ninguém me avisou que não deveria terminá-lo em véspera de dia de trabalho pois, correria o risco de me apresentar ao serviço com ar de pobre viúva inconsolável. Este tipo de livros deveria ser vendido em conjunto com um  pacote (ou mais) de lenços descartáveis  e aí, já saberíamos com o que contar.

Lembro-me em criança de ter chorado lágrimas gordas e sentidas ao assistir ao filme Bambi. Nessa altura, a minha percepção do que distingue a realidade da ficção era ainda muito ténue – se é que existia. Seria de esperar que com o passar dos anos, deixada para trás a infância e a adolescência, a linha que separa o real do fictício fosse agora bem definida. Qual quê… Venho a descobrir que há situações em que tudo se funde na minha mente e que, com relativa facilidade, me desligo da realidade como que encarnado um personagem invisível nessa ficção.

Pay it forward – para ver este filme, além de muitos pacotes de lenços, é necessário providenciar vestimentas impermeáveis, não só para nós como também para quem nos rodeia… Vi-o uma vez, vi-o duas vezes pois, achava eu já estar imune. Mas eis que começo a sentir aquele nó, aquele aperto na garganta, uma tristeza que só Deus sabe… Não havia volta possível, ia tudo acontecer de novo… e aconteceu! Não vai haver terceira vez – promessa de mim para mim.

É este o filme que aconselho para aqueles dias cinzentos em que uma boa choradeira faz falta e saberia tão bem mas para a qual não temos, na realidade, motivos suficientes. Sim, regradamente, uma boa dose de lágrimas, baba e ranho só pode é fazer-nos bem.


Crónica de Laura Paiva
O mundo por estes olhos