Médica sem diploma – Bárbara Borralho

A minha avó é médica e ainda não sabe. Isto é um facto. Até a aconselhava a tirar um curso de medicina mas ela iria logo perguntar-me se é possível inscrever-se nas novas oportunidades com a “quarta classe” e quando soubesse o tempo que o curso demoraria a tirar diria que ainda morria antes de o acabar. Não, a minha avó não é caquéctica nem tem 80 e tal anos mas tem um historial de doenças mais extenso que o palmarés dos três grandes do nosso futebol juntos. E não estou a exagerar, isso pensam vocês.

Na casa dos meus avós só passam novelas e telejornais, mais nada. Acho que a televisão tem algum dispositivo para desligar-se sozinha quando surge um conteúdo diferente. Ah não, a minha avó também vê o Portugal no Coração. Acho que alimenta o sonho de um dia lá ir. Mas isso são outras histórias. O que me preocupa é que a minha querida avó sabe mais de medicina do que eu que vejo Anatomia de Grey, Dr. House, Clínica Privada e Serviço de Urgência! Isto é uma situação alarmante mesmo que eu nunca tenha sonhado em enveredar pelo caminho da Medicina.

Quando vou ao Centro de Saúde com a minha avó é como se levasse uma guia turística comigo que me lembra de todos os locais que devo visitar ali dentro. Ora me diz que num certo canto já viu uma mulher a ter um ataque qualquer, ora me diz que a casa de banho é na primeira porta à esquerda (na minha tentativa de sair da beira dela). Depois de entregarmos uma papelada qualquer à mulher na recepção (que já conhece a minha avó de gingeira), sentamo-nos na sala de espera e aí começa o meu pesadelo. A minha avó começa a divagar sobre todas as dores que a apoquentam: ora porque lhe dói um braço, ora porque está com problemas nos rins… A verdade é que ela acerta sempre! Começo mesmo a pensar que a minha avó só vai ao médico porque não pode passar receitas de medicamentos a ela própria, caso contrário nem era preciso.

Sou hipocondríaca por causa da minha avó. Se me dói a barriga penso que estou com uma apendicite aguda, se me dá uma dor no peito começo logo a imaginar um ataque cardíaco e se tenho comichão num dos pés pressinto que é pé-de-atleta. O que me vale é que os meus avós têm uma farmácia na cozinha. Reservaram duas gavetas de um móvel para colocar apenas medicamentos. Dores de dentes? Vai à gaveta. Azia? Vai à gaveta. Um rim de fora? Vai à máquina de costura.

Dou-vos um conselho: da próxima vez que forem a um hospital ou qualquer coisa do género reparem bem nas pessoas mais velhas, autênticas pseudo-médicas que acertam em cheio nos diagnósticos. Se lhes dessem oportunidades talvez encontrassem novas doenças, desconhecidas até então. Curas não garanto, isso já é um domínio demasiado avançado até mesmo para eles.

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