O impacto da Troika e das medidas de austeridade na Arrumação – Miguel Bessa Soares

Esta semana decidi dedicar “Mundo ao Contrário” a esse sector nunca esquecido, mas sempre marginalizado pela sociedade a arrumação automóvel.

Para isso contei com a colaboração de Alfredo Janado, arrumador local com 35 anos, dos quais mais de 15 dedicados à arrumação automóvel em uma das ruas mais movimentadas da cidade do Porto.

Alfredo explica que a arrumação está nesta altura também a sofrer com a crise, e com as medidas de austeridade. Longe vão os dias em que um lugar vago era garantia de um euro “-Hoje em dia o aeurio das pessoas é pró café, no máximo tenho de me contentar com o troco, e já se sabe, a 35 centímetros o lugar não me governo.”
Como qualquer cidadão português, Alfredo ou Janado (como gosta de estar e ser tratado) mostra-se muito preocupado com esta crise, e o impacto da mesma numa actividade “muito difícil, sem apoios, e marginalizada por natureza”. Janado recorda o início da crise “- Quando isto começou era fácil, não dava moedinha, riscava-se o carro, mas nos dias de hoje, se por um lado o dinheiro não chega para investir em canivetes, por outro os carros estão tão riscados que já não se arranja um espaço para fazer um risco.”

A retracção do mercado e falta de investimento do estado são também motivo de preocupação. “- Isto é uma actividade muito difícil,  há muita falta de formação, e o estado não investe em cursos nem workshops, temos que aprender por nós próprios, e a canalha já se sabe, não quer saber disto.”
Janado sente na pele a falta de investimento, há cerca de 5 anos início uma actividade que tem em vista tirar mulheres da rua “- Eu tiro-as da rua, levo-as para minha casa”, quando referi o facto de ele próprio também viver na rua ele corrigiu-me: “- Desculpe, eu vivo nesta avenida, que tem árvores, é espaçosa, você não imagina em que tipo de ruas fui encontrar estas desgraçadas.” Para esta actividade paralela Janado explica que por diversas vezes apresentou projectos para se tornar uma IPSS, ou mesmo uma fundação, mas o estado não quer saber de investimentos, e deixa estes projectos fulcrais de lado.

Aos 35 anos Janado tem sonhos que ainda gostava de realizar “- Claro que tenho sonhos, o sonho de qualquer arrumador é subir na vida, passar a limpar os vidros da frente dos carros nos semáforos, mas com a crise que se vive posso arriscar o investimento de baldes liquido e panos, e acabar por falir e perder tudo o que construí até ao momento”.

Crónica de Miguel Bessa Soares
Mundo ao Contrário