O Tribunal Constitucional – João Cerveira

Muitos de vós esperariam que eu viesse aqui dissecar a entrevista a José Sócrates. Mas fazê-lo seria, simplesmente, estar a repetir-me. Portanto, se quiserem saber a minha opinião sobre muitos dos assuntos que ele falou, basta ler as minhas crónicas anteriores. Sobre essa entrevista direi apenas duas coisas: tal como na entrevista a Pedro Passos Coelho no ano passado, esta dupla de entrevistadores fez as perguntas, induziu as respostas e interrompeu quando o entrevistado estava a falar. Simplesmente não entendo este tipo de entrevista. Se não querem ouvir o entrevistado, não o convidem. A segunda coisa é, a certa altura, Sócrates diz que quatro ex-presidentes do PSD fazem comentário politico na televisão e nenhum foi contestado. O jornalista Vítor Gonçalves diz de imediato “mas nenhum foi primeiro ministro”. Deve ter sido muito traumatizante para o jornalista da RTP aqueles meses em que Santana Lopes, actual comentador da CM TV e ex-presidente do PSD, foi Primeiro Ministro de Portugal, ao ponto de ele não se lembrar.

Acho, no entanto, mais grave as declarações da deputada e vice-presidente do PSD Teresa Leal Coelho na Assembleia da República, acerca do que, segundo ela, o PSD espera do Tribunal Constitucional. A deputada disse que o PSD espera que o Tribunal decida tendo em conta o estado actual da economia e o memorando com a Troika, entre outras coisas. Teresa Leal Coelho não deve conhecer a função do Tribunal Constitucional (TC), o que para uma deputada da República é muito grave. Não cabe ao TC avaliar politicamente o estado da economia – embora, de certa forma, o tenha feito o ano passado. Ao TC cabe avaliar, com o afastamento que se impõe a um tribunal no âmbito do principio da separação de poderes – que o PSD também parece estar esquecido -, se as decisões do órgão executivo estão de acordo com a Constituição, garante máximo dos direitos, liberdades e garantias de todos nós. Acho, sinceramente, que Francisco Sá Carneiro deve dar voltas no túmulo de cada vez que um dirigente do PSD vem com a história da “responsabilidade” pressionar o TC. Se existir algum responsável por uma Lei ou Decreto-Lei ter sido enviado para o Presidente da República viciado com matéria inconstitucional, será sempre (como sempre foi) da responsabilidade de quem a produziu e/ou a aprovou, ou seja, a Assembleia da República e o Governo de Portugal. Nunca o TC.

O desespero é tanto já dizem também que os partidos da oposição não respeitam a legitimidade constitucional do governo em funções quando apresentam moções de censura. Que eu saiba uma moção de censura está prevista no regulamento da Assembleia e é legal. E foi usada já pelo PSD na oposição. Que moral tem uma maioria que cria e aprova um Orçamento, ao que tudo indica, ferido de inconstitucionalidade em vários artigos e que pressiona o TC a aprová-lo de qualquer forma, para acusar os outros de não respeitarem a Constituição?

 

Crónica de João Cerveira

Diz que…