Qual é a sua posição em relação ao sexo? – Miguel Bessa Soares

Passavam 10 minutos desde a última vez que eu tinha olhado para o relógio. Ela veio ter comigo, comigo, no meio de um bar barulhento cheio de gente que se sacudia num ritmo frenético ao sabor da música. O Artur e o Jorge já há muito tempo me tinham abandonado, a fraca resistência adolescente ao álcool é tramada.

Ela aproximou-se de mim arrumou o meu cabelo de corte tigela, estilo Beatle fora de época, da orelha:
– Qual é a tua posição em relação ao sexo?
– Desculpe? – Meu Deus eu era um puto estúpido!

Se fosse hoje não perdoava: “Toureio e sou aficionado”, mas na altura era um beto, de corte tigela e óculos redondos, uma antecipação do Harry Potter, sem truques. Pedia desculpa por tudo e por nada, até pelo que não tinha culpa, e pior, eu não achava que tinha culpa, achava que “Desculpe” era mais sexy, ou parecia mais inteligente do que “não percebi”. Mas não percebi o quê? Claro que percebi, aliás sonhei aquele momento vezes e vezes, tinha frases ensaiadas, mas na altura “Desculpe” foi o melhor que o meu cérebro carregado de hormonas conseguiu…

Felizmente talvez fosse essa inocência que ela procurava nessa noite. Não desistiu de mim e prosseguiu:
– Percebeste bem querido, é mesmo o que tu ouviste!
– Ah, pois, em relação ao sexo eu prefiro deitado. – Cala-te estúpido, pensas que estás a ser engraçado e tens tanto para aprender. É um milagre não ficares virgem para o resto da vida. Está visto ao que estás destinado.

Ainda bem que o álcool perdoa tanta coisa. Sim foi nessa noite. O Artur e o Jorge? Só os vi na manhã seguinte. Completamente lixados por tê-los abandonado no meio do bar.

Felizmente o relato da primeira aventura sexual perdoa tudo nas promissoras duradouras amizades masculinas adolescentes.

Mas não foi uma aventura. Eu estava apaixonado. Sentia-me um Tom Cruise completamente apaixonado pela sua Kelly McGillis, só me faltava o avião, mas a banda sonora estava lá. O walkman amarelinho tocava incessantemente Take my Breath Away – Berlim.

Infelizmente nunca mais a vi. Mas a primeira lição que aprendi naquela noite modificou-me para sempre.

Crónica de Miguel Bessa Soares
Geração 80