A verdadeira praxe – João Cerveira

A verdadeira praxe significa integração na academia. É uma forma de dar as boas vindas aos novos alunos de uma forma engraçada e divertida. Assemelha-se muito às praxes aos novatos em clubes ou outras instituições. São brincadeiras como fazer declarações de amor às “doutoras” ou “doutores na praxe” (colegas de outros anos, ficando assim a conhecê-los), pular, correr, cantar, fazer jogos, “pega monstros” (colar-se o mais possível) nalgumas paredes, etc. E como é que tudo isto faz com que se integrem na academia? Ficam a conhecer as tradições académicas, conhecem colegas do mesmo ano e colegas dos outros anos que estão a exercer praxe, e ficarão para sempre conhecidos como o caloiro que melhor cantou, que melhor pulou, que fez a melhor e mais criativa declaração de amor, … Enfim, fica conhecido por e conhece toda a faculdade. E no final vem jantar ou sair com todos nós.

Esta é a verdadeira praxe, responsável e segura. Quem, em nome da praxe, humilha só por humilhar, para se sentir superior como, infelizmente acontece nalguns casos, não está a praticar a praxe. Quem põe em causa a integridade física dos caloiros, não está a exercer a praxe. Está só a ser irresponsável. Isso não é praxe. Infelizmente é o que se vê na TV, porque o que vende, o que dá audiência em Portugal são as desgraças e infortúnios dos outros. E se se fizer crer que é habitual, ainda vende mais, dá para fazer um dossier sobre o assunto e/ou um debate televisivo sobre isso. Lamentável.

Eu tenho a sorte de pertencer à academia de Coimbra. E a nossa academia, a mais antiga e, consequentemente, com mais história e tradição do país, orgulha-se de preservar essa tradição, mas tem um código de praxe que é necessário cumprir à risca, já para evitar que quem não sabe praxar, não ultrapasse os limites estabelecidos como razoáveis. Se cumprir o código nada disso acontece. Para começar estabelece que a praxe na Universidade de Coimbra não é mista (rapazes praxam rapazes, raparigas praxam raparigas). Depois estabelece a hierarquia de cada um (nomeadamente segundo o número de matriculas), aquilo que podem e que não podem fazer, bem como as protecções que podem ter (especialmente os caloiros). Cabe a todos os estudantes na praxe e ao Conselho de Veteranos (da AAC) fazer cumprir o código. E o Conselho pune quem não cumpre.

Bem sei que “nem tudo são rosas” e que, apesar de existirem regras, há sempre quem esteja disposto a quebrá-las. Mas assim como há bons profissionais e maus profissionais em qualquer empresa ou instituição, também há pessoas que cumprem bem as regras e os objectivos da praxe e outros não, por incapacidade ou incompreensão, por desconhecimento ou deliberadamente. Mas não pode o erro ou violação das regras ser passado para a opinião pública como situação permanente e comum, como faz comunicação social (salvo raras e honrosas excepções). Recordo-me que a TVI fez uma peça no dia do cortejo da Queima das Fitas de 2003 precisamente sobre as emoções da Queima e do cortejo da mesma. Possivelmente não sabem mas a Queima, enquanto tradição que é, faz parte da praxe académica coimbrã. E é uma peça a ver ou rever por todos. Salvo alguns excessos que existem em qualquer festa, universitária ou não, o certo é que a esmagadora maioria vê na tradição e espírito académico de Coimbra (elementos fundamentais da praxe) uma experiência única e inesquecível. E aqui, mais do que nas aulas ou corredores das faculdades, conhecem-se amigos para a vida.
Por tudo isto vos peço que procurem saber mais antes de formar a vossa opinião sobre a praxe. Não identifiquem a praxe com meia dúzia de energúmenos que imoralmente a invocam para libertarem as suas frustrações.

 

 

Crónica de João Cerveira

Diz que…