Se há coisa que não pode dizer-se sobre Björk é que seja uma artista acomodada. Desde os primeiros passos da sua já extensa caminhada musical, se percebeu um fôlego criativo absolutamente invulgar e sempre em demanda por coisas novas, por cruzamentos improváveis de géneros e até por alargar fronteiras do que deve ser um produto musical. Se não bastasse, para percebermos a revolução paulatina de Björk, o seu recorrente aprofundamento da mistura entre electrónicas e elementos acústicos, a caminho de uma visão ímpar e que envolve um detalhismo quase microscópico (mesmo científico) e, ao mesmo tempo, a amplitude de uma verdadeira obra orquestral, o inovador Biophilia, de 2011, inquietava ainda mais: buscava a união entre tecnologia e mundo natural. Depois de uma empreitada com esse peso, com reacções díspares de crítica e de admiradores, e sobretudo na sequência da separação do seu companheiro de treze anos, mesmo o mais inconvencional (e inquieto) dos espíritos, há-de sentir-se irremediavelmente mundano.
No caso de Björk, a chapada da vida foi um chamamento de realismo que não mudou a essência da sua música. Vulnicura, com a colaboração de dois novatos muito requisitados na electrónica hodierna – a saber, o venezuelano Arca e o britânico Bobby Krlic (The Haxan Cloak) -, repisa a mistura entre electrónica e orquestração, com a sedução vulcânica do costume. Desenganem-se aqueles que esperam um registo de genuíno intimismo, como seria “normal” num disco com a aura de uma separação, em que a música tende a converter-se numa expressão de formas mínimas, mais assertivas e emocionais. Em Vulnicura, a emoção não deixa de ter essa vulnerabilidade, mesmo a tonalidade obscura e ambígua, mas ajusta-a ao devaneio hiper-musical que fez de Björk um ícone da excentricidade elegante. Aqui, só mudou a palete de cores e, do garrido para o pardo, nasceu um dos melhores discos que ela deu ao mundo.
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