Necessidades Educativas Especiais (Parte 2) – A Escola para Todos! – Lúcia Reixa Silva

A semana passada, propus-me a falar deste tema, e da realidade das crianças e jovens com Necessidades educativas Especiais inseridos na Escola pública.

Esta semana, vou partilhar convosco aquilo que penso poderem ser algumas medidas a ser implementadas com o objectivo de conseguir de facto o apoio e inclusão destas crianças e jovens na Escola, nomeadamente:

  • Assegurar a estabilidade dos docentes de educação especial (EE) com especialização adequada na área de disfunção específica, garantindo o acompanhamento em continuidade;

  • Colocar os técnicos necessários (internos ou externos) e adequados (psicólogos, terapeutas da fala, técnicos de serviço social, animadores, etc.) tendo em conta o rácio para as NEE, que proporcione acompanhamento de continuidade e avaliação especializada e promova a integração no espaço escolar;

  • Aumento do número de assistentes operacionais na Escola, e formação adequada para que possam desenvolver ;bem o seu trabalho! Actualmente há um “corte” de tal forma desadequado que chegam a existir uma ou duas assistentes para 100/150 crianças…O que significa que não chegam para as necessidades destas crianças, nem para a “segurança e vigilância dos intervalos”, vigilância de portas, casas de banho, etc!!! Estes funcionários são quase “omnipresentes” pelo trabalho que desenvolvem…e ainda vigiam e dão assistência às crianças com NEE que estão nos “intervalos”, naturalmente, com o seus colegas, mas que precisam de assistência ainda mais cuidada e próxima!

  • Construção e aplicação de um PEI – Programa Educativo Individual – adequado caso a caso: Por ex., se num jovem com baixa visão (ambliopia), as adequações passam apenas pela utilização de letras aumentadas, números aumentados e afins, e noutros casos, por exemplo limitações motoras, poderá passar pelo equipamento adequado, acessos e mobilidade, casos existem em que é necessária uma intervenção diferente, em que as adequações curriculares podem e devem passar pela construção de um projecto de vida, com real flexibilidade em termos de actividades a desenvolver e com vista a percurso alternativo (na verdade, muitas vezes o PEI apenas reduz componentes a leccionar, mas não é um percurso alternativo real) adequado caso a caso; um programa que vise a promoção da autonomia da criança ou do jovem com NEE e a sua integração na Sociedade, respeitando cada situação.

    A questão aqui é perceber como e onde se podem desenvolver estes percursos curriculares, e não sujeitar as crianças e jovens com NEE a adequações curriculares básicas e desajustadas à realidade, que lhes permitem a permanência por ex. na sala de aula, sem que eles “ganhem nada com isso”, e estamos a “brincar” ou a “fingir” que a escola é inclusiva. As crianças e jovens com NEE devem estar inseridas no meio escolar, mas beneficiar de ensino especializado sempre que for viável…Nem me vou alongar sobre este assunto muito controverso e nada fácil, que depois remete para questões ainda mais profundas e muito técnicas, que não “cabem” neste espaço de crónica…muito haveria para dizer…mesmo!

  • Elaboração destes PEI (Programa educativo individual) pelos docentes de educação especial e pela equipa técnica, (com os técnicos presentes de facto!), juntamente com o director de turma ou professor titular ( no caso do 1º ciclo), em vez de ser da responsabilidade do director de turma (que é o que acontece nas escolas por força do Decreto-Lei que referi anteriormente, e só não é pior porque os professores têm o bom senso de se ajudar nesta matéria e de não deixar que por força de um Decreto se cometam injustiças);

  • Existência de Unidades de referência especializada que respeitem a especialização!!! Frequentemente as Unidades de referência (para quem não saiba, são Unidades dentro do espaço escola, que visam a especialização em determinada NEE, por ex. Unidade de referência para “cegueira e baixa visão”, Unidade de referência para Autismo, etc, e que têm, ou devem ter, o equipamento e materiais adequados e os técnicos ou parcerias técnicas adequadas à situação específica) integram casos de alunos que não se adequam à Unidade, nem se adequam ao “estar todo o dia em sala de aula”…Como tal, as Unidades passam a não ser de referência, porque não respeitam a população para a qual foram criadas! Nem beneficiam os alunos que “lhe pertencem”, nem beneficiam os alunos que ali são “deixados” sem “lhe pertencer”…Esta realidade seria seguramente alterada, se existissem Unidades de referência várias dentro de cada concelho, ou em concelho fronteiriço, e se existisse transporte gratuito e adequado de casa de cada aluno para a Unidade e vice-versa. Na verdade as crianças e jovens vão muitas vezes para a Escola mais próxima, que não tem uma Unidade que se adeque ao seu caso; se houvesse maior informação, transporte gratuito adequado e com assistente operacional a bordo, que fizesse os percursos necessários, talvez as Unidades tivessem os alunos que a elas se adequam, criando-se reais oportunidades de desenvolvimento e inclusão! Como tal não acontece, raramente os alunos estão adequadamente integrados e devidamente acompanhados! Também não me irei alongar mais sobre isto, porque há muito mais para se dizer e para fazer, e cada caso é de facto muito particular;

  • Assegurar que na Escola pública se ofereça o ensino “multilingue”, ou seja, que as crianças e adolescentes tenham acesso facultativo, mas de oferta obrigatória nas Escolas, à LGP (Língua gestual portuguesa) e ao Braille, por exemplo – a integração das pessoas com NEE, passa por uma linguagem acessível a todos e pela sensibilização para outras realidades; não haver sequer opção da LGP e do Braille na generalidade das Escolas é uma falha grave que “ignora a Diferença”, por um lado, e não promove o interesse por outras formas de comunicação com o Outro, que é especial. Repare-se que aqui o objectivo seria sempre o da inclusão e de sensibilização do grupo de pares para esta situação, porque o aluno com NEE nestas áreas frequentemente tem acesso na Escola ou em estabelecimento especializado a estas formas de comunicação; mas se o grupo turma não tem acesso a esta forma de comunicação, e se o aluno não consegue comunicar de outra forma, o erro está em não facultar este acesso à LGP, ao braille, por ex. Sei bem que é uma medida controversa (e não são sempre?!), mas na verdade, é surpreendente como os alunos “aderem” muitas vezes a estas medidas, e do que são capazes, professores e alunos, com vista à integração do aluno com NEE (todos os envolvidos são fantásticos quase sempre!). Felizmente existe um fenómeno de solidariedade nas Escolas, e no que se refere a esta matéria, muito bom, o problema está mesmo nos recursos que falham, nos “cortes” que fazem, que cada vez mais prejudicam todos, e de forma ainda mais lesiva, os mais fragilizados…A oferta de outras formas de comunicação, potencia uma sociedade mais justa e solidária, onde não temos só interesse em aprender Inglês (atenção, sou totalmente a favor da oferta obrigatória do ensino de Inglês nas Escolas), espanhol, francês, outras línguas ou dialectos que se ajustem às realidades do meio envolvente das escolas, mas também podemos aprender LGP e Braille, por ex., e isso marca uma grande diferença, e promove a comunicação real entre pares, por um lado, e a sensibilização para a diferença, por outro lado!

Colocadas aqui algumas das “minhas” propostas sobre o que podia ser feito, saliento que há muitas mais seguramente, e haverá sempre, porque há um caminho a ser construído – Incluir não é colocar as crianças e jovens com NEE no mesmo espaço escolar, fazer algumas adequações curriculares e pronto! Isto não é incluir…até poderá contribuir para acentuar a diferença na verdade…Incluir é um processo!

A verdade é que tenho assistido nas Escolas por onde vou passando a “verdadeiros milagres” produzidos por um enorme esforço humano, onde professores, alunos do grupo turma, aluno com NEE e familiares, fazem de tudo para que o melhor aconteça!

O problema é a “demissão” do Estado nesta matéria, a inexistência de recursos e execução de propostas adequadas a par da existência de Decretos e medidas que só “baralham” e dificultam o trabalho de quem se preocupa no dia a dia com estas crianças e jovens!

Sempre pensei como seria tudo mais fácil se os Ministérios fossem tutelados por quem percebe o que está a fazer, pessoas que conhecem a teoria, os livros e os manuais, mas que aliam este saber à verdade, à realidade, porque trabalharam no “terreno”; pessoas que governem para o País, mas com as pessoas reais!

Até esse dia chegar, eu, como cidadã, vou pensando nestas coisas…e hoje achei bem partilhar convosco estes meus pensamentos!

Obrigada a todos os que me acompanharam nesta crónica.

Tenham uma óptima semana! 

 

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Crónica de Lúcia Reixa Silva
De Alpha a Omega