Acusados de corrupção pedem perdão

Que vivemos na república das bananas já todos sabemos. Que corrupção é algo tão comum como comer tremoços acompanhados de uma cerveja fresquinha, também não é novidade. Mas os acusados de corrupção pedirem perdão e saírem em liberdade? Bem, isso agora será o pão nosso de cada dia.

Para os mais distraídos, talvez seja melhor fazer uma pequena contextualização. No dia 16 de Fevereiro (segunda-feira), foi noticiado nos órgãos de comunicação social que haverá uma proposta de alteração do Código Penal, ou seja, os acusados de corrupção poderão não ir para a cadeia desde que mostrem arrependimento pelos crimes praticados e devolvam os bens e/ou dinheiro aos lesados, num prazo máximo de 30 dias. Esta proposta foi levada hoje ao Parlamento. Não me questionem acerca do resultado, porque escrevi esta crónica precisamente no dia 16 de Fevereiro… Ainda assim, e como me compete, vou opinar.

A primeira grande questão que se levanta face ao noticiado é: estou a ouvir/ler bem? Depois de recuperarmos deste atordoamento, surge uma outra, mais intelectual: o perdão é concedido de igual forma a todos os tipos de corrupção? A terceira questão volta a cair no ridículo, mas ainda assim tenho de a expor: se Ricardo Salgado, ex-presidente do Banco Espírito Santo (BES) mostrar arrependimento sai em liberdade? Ah! Esqueci-me! Esse já está em liberdade e nem necessitou de recorrer ao arrependimento… A quarta questão reporta-se a um mediático acusado de corrupção: então e o mártir José Sócrates vai continuar a ver o sol aos quadrados ou pode mostrar já arrependimento para ir lanchar à mansão de Mário Soares? Ah! Voltei a esquecer-me! Esse demorou mais de 30 dias a arrepender-se, ou melhor, ainda não se arrependeu. E os alvos de corrupção? Como ficam? Já sei, são-lhes restituídos os bens e/ou dinheiro, mas isso é suficiente? Todo o tempo, crise e sofrimento por que passaram enquanto foram roubados, também lhes são restituídos? A nova alteração do Código Penal prevê isso? Provavelmente não…

A partir de agora, e quase que adivinho o que se passará na Assembleia da República – PSD e CDS votam a favor da alteração, como não poderia deixar de ser –, será comum ouvir/ler que fulano XPTO foi acusado de corrupção, mas mostrou arrependimento e por essa razão sairá em liberdade, isto é, se alguma vez chegou a entrar. Curiosamente, poucos são os casos que dão entrada nos estabelecimentos prisionais… Constituirá esta proposta de alteração um acto premonitório face a este vazio? Talvez sim, talvez não, mas que dá que pensar, isso dá!

Agora imaginem se esta alteração for extensível a outras práticas criminais… O Manuel esfaqueou a Maria, sua esposa, mas mostrou arrependimento. O juiz, comovido e com a lágrima no canto do olho, não pensou duas vezes: “Manuel, estás livre!”. Em casa, e a aproveitar a liberdade, Manuel volta a esfaquear a Maria e esta tem morte imediata. Manuel arrepende-se até hoje! O juiz também!