A Derrota da Vitória – Viriato Queiroga

Incredulidade.

Palavra tão funesta quão significativa no imaginário do guerreiro defrontando o destino social que comummente se lhe apresenta. A inevitabilidade do fim, exigência de um sacrifício ao cidadão, demanda pelo bem maior, um objetivo social e politicamente aceite, em detrimento da lei e do bem-estar pessoal (Maquiavel ficaria deveras orgulhoso por similar aplicação bélica… Ou então, não).

Não desprezando a ideia de que o bem comum emprega uma necessária dose de sacrifício (esse tão necessário sacrifício em tempo de Guerra), o soldado, que nesta altura, farto de cigarros feitos de relva do quartel e ração digna do afamado canídeo de raça de um qualquer VIP da TVI, coloca-se na borda de um precipício, ponderando numa série de assuntos cujas implicações emocionais são demasiado profundas para que eu as documente sem ferir suscetibilidades e padecer da censura necessária ao poder de um qualquer agente estatal (a morte é algo tão longe do imaginário societário ocidental quanto Marte, apenas pontualmente explorada por uma sonda, deixando o restante para um qualquer cientista ver… O excedente… É um mero entretenimento). Esta foi a vida, a profissão que o homem escolheu ao enveredar nas lutas patrióticas (e petrolíferas), de forma a proteger a liberdade de um qualquer recalcitrante, viciado em comida rápida e televisão, tão neutra e objetiva, que penaliza toda a visão não normalizada com a corrente ortodoxia.

A vitória havia sido alcançada pelos militares. Os objetivos haviam sido plenamente alcançados: alvos destruídos, artilharia destroçada, oposição trucidada e aclamações civis, ao estilo bíblico (aqui temos liberdade para substituir a última palavra por “Al Corão” ou “Tora”, deixo ao critério do leitor). Por que razão seria que a euforia, provocada pela adrenalina não era acompanhada por um sentido de realização emocional e social, talvez até psicologicamente, mais profundo, do que a simples satisfação física? A similaridade a um “one night stand”, em justaposição à demonstração plena do amor por uma amante, em detrimento da razoabilidade hedonista de um feito capaz de deixar o jovem soldado infeliz das suas realizações, e incapaz de alcançar seja o que for, na sua futura vida, estadualmente suportada (ou não…).

Almejar a vitória, procedente da subjetividade inerente aos assuntos humanos, parece não chegar para a referência, muito mais direta, ao social conservativismo da objetivação de um qualquer governo, supostamente democrático, em prol da sua sobrevivência como Estado (e Nação).

Eis que o voo do soldado é intercetado: uma explosão havia atirado este bravo homem para o local previamente descrito. Não se tratava de um qualquer artifício. Os planos haviam, pura e simplesmente falhado. Era o acaso, a ignomínia, de Marte.

Sentado, o precipício cai sobre o soldado. Nada mais importa para além da queda em tudo o mais que não havia sucedido.

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