**estreia** Que seca de dia – Raquel Santos

Hoje os raios solares atravessam discretamente a janela semiaberta da cozinha. O céu está brilhante e sem aquelas nuvens chatas que teimam em cobrir o sol. Não há vento, ou se o há é uma briza que passa quase sem dar por isso. As folhas verdes das árvores parecem estáticas, como se de uma estátua se tratasse. Ouve-se o chilrear dos pássaros e sente-se o cheiro de terra quente. Tudo de bom o que o dia nos pode oferecer.

Sentei-me no sofá da sala. Estiquei as doridas pernas, do treino de ontem de body pump e peguei no comando da televisão. Pressionei o botão para ver o que aquela caixa preta com uma espécie de vidro nos oferece. E imaginem o que está a dar, sim o Big Brother, pois também não dá grande coisa na televisão, só se for nos canais de tv cabo, mas para isso era preciso fazer zapping e hoje não estava para aí virada. Estava aborrecida, nem o confortável sofá me satisfazia. Que seca! Não era do calor que se fazia sentir, mas era outro tipo de seca. Levantei-me, desliguei a tv e fui buscar um livro que ando a ler, super interessante que prende a qualquer instante. Contudo, aquele não era o melhor momento, não me queria prender pelas simples e calorosas palavras de um livro. Aquele virar de página consecutivo, estava a irritar-me e a por os cabelos em pé. Queria mais do que isso. E vocês logo pensam… Hum queria um homem… Ui longe disso. Para quê?! Ia que mentes pecaminosas, não pensem que eu sou…Não! Eu gosto de homens ou melhor um homem…

Se naquele momento tivesse um homem, como vocês estão a pensar, não descansava. Aí não descansava, não… era andar numa roda vira e acabava por dar ao mesmo (roda – circulo – inicio conjuga com fim- um trocadilho;)) “Olha chega-me os chinelos doem-me os pés e já agora podes chegar uma cervejinha!” E nem se fala da roupa que se tem de lavar e passar, para depois sua excelência ir trabalhar. E quem faz a minha mala? Eu, pois claro. As mulheres não são nenhumas criadas, e naquele dia estava aborrecida ponto! Nada me satisfazia, não me apetecia fazer nada de nada.
Lembrei-me de ir à despensa e lambuzar-me naquelas bolachas que tanto adoro. Menhame menhame, lembram-se do monstro das bolachas da rua – sésamo? Eu era fã dele, adorava aquela boca cheia de bolachas e migalhas a cair pelo pescoço deslizando para o peito. Muito sexy!

Observei atentamente: tinha imensos pacotes das mais diversas categorias. E agora qual é que vou escolher. Hum depois de pensar um pouco peguei no primeiro que me apareceu à frente. Eu adoro bolachas portanto, qualquer uma devia de me satisfazer. Quando peguei no pacote, caiu-me nas mãos um postite que dizia: “ Não me comas, já pensaste nas horas de exercício que tens de fazer para queimar estas calorias?” É pah! Fiquei logo mais mal disposta do que estava. Que ideia foi aquela de colocar um papel com aquele recado? As mulheres começam logo a pensar que estão gordas e parecem uma bola. Não, eu não quero ser uma bola!

Pousei o pacote e voltei costas. O que vou fazer agora? Vou ligar a uma amiga, assim estou um pouco no paleio e passa melhor o tempo. Peguei no telemóvel e lembrei-me… “Bolas, esqueci-me de carregar o telemóvel.” Pois “assinamos” contratos e depois, apesar de termos saldo, não podemos fazer chamadas. Já vos aconteceu alguma vez? Fico piursa quando me acontece isto! Não consigo contactar ninguém…

Naquele dia parecia estar tudo ao contrário, agora nem o telemóvel me safava… Num abrir e fechar de olhos apareceu uma bola de pelo. Sim, uma bola de pelo, fofinha e saltitante. Sabem quem era?! Era o meu novo cão castanho, pequeno e cheio de pelo. Não era fácil de lhe encontrar os olhos mas ele estava-me a ver-me e saltava de contente dando ao rabo.
Nunca iria pensar que um simples animal me ia satisfazer naquele dia. Ri-me com as suas trapalhadas: corria atras das galinhas e elas aflitas a fugir; tentava saltar dos obstáculos, mas como tinha patas pequenas, a cabeça ia primeiro do que as patas e pumba, dava uma cambalhota. Isto só visto, mesmo.

A seca daquele dia tornou-se num dia satisfatório e alegre.
As vezes os simples gestos da vida devolvem-nos o importante sorriso de que estamos a precisar! Já pensaram nisso?

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