O estranho desconhecido

Desde pequenos que os nossos pais nos dão conselhos. Seja no que devemos fazer, seja como nos devemos comportar, fazem-nos ver o que está certo do que está errado.

Um dos conselhos comuns a todos os pais é o de “não falar com estranhos/desconhecidos” – quem diz falar diz interagir de alguma forma com essas pessoas. E nós, filhos bem mandados, vamos cumprindo esse conselho (ou pensamos que cumprimos esse conselho) até ao dia em que os “estranhos desconhecidos” passam a conhecidos.

Se pensarmos bem, qualquer pessoa, seja familiar ou amiga, começou como desconhecida. Não a conhecíamos de lado nenhum, apenas em alguns casos somos “obrigados” a falar/interagir com elas. Todos os amigos que fizemos ao longo da vida eram, no início, desconhecidos (mas como eram os amigos da escola, os amigos do trabalho, os amigos do desporto, a coisa parece que não conta para esta estatística/conselho dos pais). Portanto se fossemos a cumprir esse conselho à regra estaríamos sozinhos no mundo, rodeados de imensa gente sozinha, sem conhecer outras pessoas. Claro que estou a levar o conselho mesmo à letra porém a verdade seria essa.

Em pequenos esse conselho surge pelo medo de acontecer algo aos filhos. Mas e em jovens e adultos? Porque estranham os pais se dissermos “olha vou ali beber café com um desconhecido”? Também continua o medo? É que isto das novas tecnologias leva a que muitas pessoas se relacionem sem que se tenham visto pessoalmente, cara a cara. São as “amizades” fáceis do Facebook, são os seguidores ou lá como se chamam no Instagram, são as várias aplicações feitas simplesmente para se conhecer outras pessoas. Pessoas que são completos estranhos, que podem ou não corresponder às fotografias ou à imagem que fazemos dessas pessoas. E depois destas amizades virtuais algumas conseguem durar imenso tempo contudo não deixam de ser dois estranhos. Será que se se vissem ou passassem lado a lado se reconheceriam? Quantas vezes acabamos por contar mais da vida ou do que sentimos  esses desconhecidos amigos (que nos ouvem sem critivcar ou pelo menos achamos que sim) do que a quem conhecemos na realidade?

Mas e ao fazer a transição do virtual para o real? Até que ponto estamos a não ter em consideração o conselho dos pais? E aos estarmos numa rua e ajudarmos alguém a atravessar ou que caiu? Não estamos também a não o ter em consideração? É um estranho na mesma. Porém se ajudarmos somos boas pessoas e os pais educaram-nos bem; se não ajudarmos somos mal educados – apesar de só estarmos a seguir os conselhos dos pais.

Até onde é que um desconhecido é desconhecido? Se o “conhecermos” antes, virtualmente por exemplo, é considerado desconhecido? E porque é que os pais se afligem tanto com isto de nos encontrarmos com alguém da internet? No nosso dia a dia podemos encontrar as mesmas pessoas (ou piores). Que medo é este dos pais e dos estranhos?

São perguntas para reflectir (ou não) e às quais não sei responder. Talvez porque não sou mãe. Talvez nessa altura saiba responder e tenhas as mesmas preocupações. Fica apenas o registo que desconhecidos somos todos uns dos outros até que permitamos que nos conheçam.