O quiduxo-mor do reino

Pela primeira vez na minha vida tive saudades de Cavaco Silva. Sim, este ser que nunca votou no homem, que era jovem de mais para o querer ver em São Bento e cínico de mais para achar relevância em vê-lo em Belém, teve saudades dalgum sentido de estado, e não só, na… presidência.

E quem é que me fez ter saudades de tal sinistra criatura? Um nada sinistro, até querido, de certeza fofinho, com laivos de ursinho de peluche, sim, esse mesmo, o nosso “quiduxo-mor do Reino”, Marcelo Rebelo de Sousa.

O nosso amigo mais consensual, que não perde uma oportunidade de se enfiar nessa qualidade pelos olhos de todos os portugueses adentro, que vagueia de Norte a Sul do País a afagar cabeças de recém-nascidos bem como de velhinhos simpáticos, que acha que Rosa Mota é mais importante que ter ou não gente competente a governar-nos – e nisto, por vezes, até que lhe tenho que dar razão, ele tem um saber de experiência feito -, que até quer continuar a ajudar-nos a ver o óbvio como comentador de televisão presidencial… não quis aparecer, não quis participar, no fundo, não quis nada com a responsabilidade sobre o futuro do nosso País, fortificando a cada vez mais enraizada ideia que o Presidente, realmente, é um verbo de encher os telejornais de sorrisos e acenos mais ou menos energéticos.

Quando o mal-amado Cavaco Silva, que Rá o tenha, exigiu um acordo escrito para a Geringonça ver a luz do dia, conseguiu dar relevância à Presidência, e com isso, conseguiu dar estabilidade a um governo que todos previam de curta duração, numa espécie de psicologia invertida. Talvez não tenha sido esse o objectivo inicial, mas a história não se faz de intenções, e sim de acções.

Em comparação, “o quiduxo-mor do reino” deu com toda a celeridade, e sem colocar qualquer condição, a possibilidade da Geringonça funcionar sem qualquer acordo, vínculo ou garantia, no fundo, fazer equilibrismo sem rede.

O resultado final será igual para Marcelo, mesmo que a casa do lado arda, ele sabe que os portugueses estão tão hipnotizados pelos afagos presidenciais diários que nada de mal lhe irá acontecer, a reeleição está garantida. A questão é… o que é que isto diz sobre a nossa democracia? Melhor, o que é que isto diz sobre nós enquanto povo?

Ps. Claro que Cavaco, cognome, a múmia presidencial, também deu possibilidade de Passos Coelho liderar o governo novamente, no entanto, houve sempre a preocupação de criar condições para haver governabilidade, coisa que não parece afectar o… “quiduxo-mor do reino”.