O terminal

    Olá estimados leitores. Parece-me que os meus queridos neurónios de estimação (um casalinho adorável), decidiram tirar férias antecipadas este ano e viajar para o estrangeiro. Neste momento devo dizer que o seu paradeiro me é desconhecido, pelo que só posso esperar que estejam bem e em segurança e, acima de tudo, que regressem com energia renovada porque quero um 2016 em grande.

     Como não os tenho comigo, e à falta de melhor inspiração, hoje vou falar de aeroportos. Dada a época de festividade, muitos são os que viajam para casa, para junto das suas famílias enquanto outros viajam de férias para celebrarem um Natal ou Ano Novo diferentes (que julgo ser o caso dos meus neurónios).

     Sempre tive uma personalidade curiosa. Adoro observar o que me rodeia e, nos aeroportos, fico doida. Tenho um fetiche por aeroportos, vá-se lá saber porquê. Cada pessoa ali tem uma história, há uma energia no ar, é um local que considero altamente emotivo. Há quem viaje em negócios, sentindo-se ora aborrecido por ter de viajar ora entusiasmado por ir passear e sair da rotina e muitos outros porque vão de férias para um local de escolha, prontos a deixar o stress para trás e depois, há aqueles que mais adoro, aqueles que chegam ou partem por motivos pessoais.

     Cada uma das pessoas que se cruzam nesses terminais tem uma história, uma razão para estar ali. Muito frequentemente, quando era mais nova e não havia nada para fazer, a minha sugestão era sempre “Vamos para o aeroporto fazer de conta que estamos à espera de alguém!” Claro que sempre fui ignorada…

     Adoro esperar alguém nos aeroportos. Coloco-me bem perto da porta de chegada e observo os que ali esperam. Têm placas com nomes, têm cães (sim, é bem frequente no aeroporto de Barcelona encontrar pessoas com os seus cães à espera de alguém), flores, presentes. Escondem-se estrategicamente para surpreenderem quem chega. Assisto a lágrimas, a corridas, a abraços apertados, vivo a emoção como se fosse comigo, facilmente me cai uma lágrima ao sentir e ver aquela saudade, aquele entusiasmo e expectativa.

     Mas, se o terminal de chegadas é um ponto de energia positiva e de amor, já o de partidas é um terminal de dor. Ainda hoje recordo com um nó na garganta cada viagem que fiz para Barcelona, em que me tinha de despedir dos que amo, olhar para trás, com o corpo trémulo e um aperto no coração por vê-los ficar para trás. Claro que neste terminal também há muitos que seguem contentes por estarem a caminho de umas férias, de uma jornada há muito esperada, mas o peso dos que sofrem supera qualquer energia positiva.

     Nas muitas viagens que fiz enquanto estava sozinha em Barcelona (no mínimo uma por mês), encontrava um certo conforto dentro do aeroporto. Pensar no que iria na cabeça de todas aquelas pessoas indo ou chegando de algum lugar. Gostava de me sentar e olhar à minha volta, escutando conversas ou simplesmente observando a linguagem corporal de quem por ali esperava como eu. Adoro que me esperem e adoro esperar. Emociono-me sempre, é uma excitação que me faz relembrar as sensações que sentíamos quando crianças, em que as emoções tomam conta do comportamento e em que nada mais importa, a não ser o que nos vai no coração, aquele nervoso miudinho.

     Como referi numa outra crónica, Ser Emigra não conheço muito do mundo mas, tendo vindo para Barcelona sozinha permitiu-me fazer mais do que quinze viagens num ano, sempre cheias de emoção. Claro que, também adoro andar de avião. Adoro a descolagem e a aterragem. Adoro olhar pela janela. Só não gosto da comida…mas nestas muitas viagens que fiz, o aeroporto sempre foi o meu consolo, o cheiro do sabonete do aeroporto de Barcelona, o cheiro do ar, as cadeiras ora vazias ora cheias de quem espera. Saber que estava rodeada de pessoas que possivelmente sentiriam o mesmo que eu, amenizava a minha tristeza.

     O fascínio que tenho por aeroportos não tem a ver com os aviões, nem com o facto de ser ali que nos transportamos para um local a milhares de quilómetros de distância furando os céus, nem tão pouco tive alguma vez desejo de ser hospedeira de bordo, piloto ou controladora aérea (ganham bem mas bolas, que profissão desgastante…). Este meu fascínio prende-se mesmo com as pessoas que por lá passam, pelas suas vidas, pelas suas experiências e sentimentos.

     Apesar de raros, os acidentes aéreos também acontecem e a verdade é que desde os mais recentes (incluindo o da Germanwings), nunca mais olhei para os placards de chegada da mesma forma. O leitor consegue imaginar o que seja olhar para o número de voo que aguarda e não ver a hora de chegada? Claro que viajar com segurança num avião dificilmente depende de nós, mas há muitas outras viagens em que está nas nossas mãos assegurar que chegamos ao destino.

     Por isso, este ano, no seguinte, e nos que se seguirão, lembre-se sempre dos terminais dos aeroportos, porque a vida está cheia deles, de terminais. Damos muita coisa por garantida, principalmente no nosso dia-a-dia quando viajamos de carro, de metro ou comboio. Aquando dos atentados recentes em Paris, Jean Todt, presidente da Federação Internacional do Automóvel disse algo que desagradou a muitos, “…Cada dia que passa morrem 3.500 pessoas nas estradas. É 30 vezes mais que o número de pessoas assassinadas nos atentados de Paris”. É, de facto, um comentário invulgar mas uma realidade, e essa, depende de nós. Isso faz-me pensar nas 3.500 famílias afetadas pela perda de alguém de forma tão trágica, diariamente.

     O nosso lar é um terminal onde, todos os dias, dizemos “até logo” ou “até já”, assumindo que em poucas horas estaremos reunidos, que aqueles que amamos estão ao virar da esquina. Nada na vida é garantido. Um dia estamos aqui, e de repente tudo muda. Sendo esta altura também um momento em que muitos se deslocam de carro, saibam que depende de vós assegurar aquele abraço apertado, aquela emoção do reencontro, cabe-vos a vós assegurar que a energia do vosso terminal de chegadas se mantém intacta e perfeita na sua essência.