Han Solo: Uma História de Star Wars (Review)

Quatro anos, quatro filmes! Se a agridoce exposição a Star Wars ainda não o fez perder o interesse talvez seja um dos resistentes que quer dar uma pequena esperança a Solo. Depois do conturbado Os Últimos Jedi, que muitos deixou a desejar, este novo filme é para alguns um foco de esperança, e para outros o fim da linha para a Disney. Mas será que consegue reatar os laços com uma fandom em constante guerra civil desde 1999?

Título Original: Solo: A Star Wars Story 

Ano: 2018

Realizador: Ron Howard

Cinematografia: Bradford Young

Produção: Simon Emanuel, Allison Shearmur, Kathleen Kennedy

Argumento: Jonathan Kasdan, Lawrence Kasdan

Actores: Alden Ehrenreich, Joonas Suotamo, Woody Harrelson, Emilia Clarke, Donald Glover

Música: John Powell

Género: Sci-fi, Acção, Aventura

 

 

 

O filme que nenhum fã pediu tinha tudo para falhar. Phil Lord e Christopher Miller eram os realizadores anunciados, conhecidos pelo seu trabalho em The Lego Movie e 21 Jump Street. No entanto, parece que o seu sentido de humor não agradou a Lawrence Kasdan, o visionário argumentista responsável por O Império Contra-Ataca, e noutras andanças familiares, por Salteadores da Arca Perdida. A aproximação aberta dos dois realizadores ao argumento, e a fúria de Kasdan terá levado Kathleen Kennedy a dispensar ambos, e a trazer uma aposta segura. Ron Howard tomou as rédeas, e pelos rumores, foi obrigado a enveredar por alguns reshoots, algo que é usual em filmes deste calibre, mas que ganha novo sentido quando estes problemas internos assombram as produções.

Pelo meio destas produções conturbadas, o YouTube tornou-se palco de uma pequena rebelião, com alguns produtores de conteúdo desta plataforma a pedir a demissão de Kennedy depois do altamente bipolar Os Últimos Jedi. Esta é responsabilidade acrescida e a prova de fogo para Solo: A Star Wars Story. E, surpreendentemente, apesar de todo este rebuliço, parece que a saga de George Lucas ainda tem alguma coisa para dar.

O início do filme é uma sequência de eventos alucinantes, com saltos temporais que contam o início da aventura de Han Solo (Alden Ehrenreich). Há muito potencial neste primeiro acto, e algumas surpresas pelo caminho. Como em Rogue One, não há as famoso “letreiro galactico” da saga Skywalker a dissipar-se no infinito, mas algumas frases soltas que completam esta ausência, seguidas da construção do mito da personagem icónica do original Harrison Ford.

E se há espaço para tudo nas primeiras dezenas de minutos! Da história de amor que prende o famoso contrabandista ao planeta natal e a Qi’ra (Emilia Clarke), à forma inesperada com que se encontra com Chewbacca (Joonas Suotamo), poucos serão os filmes da saga com um ritmo tão frenético, e mesmo assim tão acertado pela pertinência de cada um dos momentos. O filme apresenta também uma das sequências de guerra mais pregadas à realidade, com uma clara inspiração na Primeira Guerra Mundial, e que dita um verdadeiro ponto de viragem para o protagonista. Mesmo que Rogue One tenha prometido um conflito mais realista e militarizado, é Solo que ganha o caneco com uma exposição de uns quantos minutos.

O segundo e terceiro acto transformam Solo no contrabandista, mas introduzem também algumas adições surpreendentes à saga, tanto pelas suas personagens, que lentamente se vão revelando e transformando, como pela atenção à variedade de localizações na galáxia muito, muito distante. É então que surge Lando Calrissian (Donald Glover) e a sua sidekick, L3-37, um droid reaccionário que atinge picos de loucura como nunca houve em Star Wars, marcada pelo tempo em que vivemos, e que certamente vai buscar muita da sua personalidade a situações não muito longínquas na nossa sociedade, como a resistência ao racismo e ao machismo. Destaca-se também o encontro com a Millenium Falcon, com um desenrolar em particular que ajuda a desvendar muito do que acontece na trilogia original no que toca a nave da lendária corrida de Kessel em 12 parsecs.

De situação em situação, Han Solo vai ganhando forma como personagem, e o argumento tem a preocupação em atribuir algumas das qualidades do protagonista aqueles que cruzam o seu caminho. Estas personagens, especialmente Beckett (Woody Harrelson) e Qi’ra (Emilia Clarke), são fulcrais para vislumbrar muito do que Han Solo será em Uma Nova Esperança, e torna-se assim mais fácil perceber as motivações e desilusões que leva para o quarto episódio da saga. Vislumbrar também a construção da amizade com Chewbacca é bastante gratificante, e no fim do filme há poucas pontas soltas para o protagonista, embora outros caminhos explorados possam sem dúvida levantar questões.

O terceiro acto em particular parece responder a uma das dúvidas mais permanentes sobre Han Solo através de uma cena que certamente fará muitos fãs olhar para o Episódio IV com um pequeno sorriso. Há ainda lugar para uma dúzia de easter eggs, e um cameo, tão inesperado e surpreendente que fará muitos queixos cair ao chão. No entanto, esta supresa é também uma particular fonte de confusão para os mais distraídos ou desgarrados da cronologia de Star Wars!

Sobre as actuações, Alden Ehrenreich surpreendeu pela positiva, capturando a essência e os maneirismos de Harrison Ford, sem que isso o iniba de acrescentar algo de novo a personagem. Particular apreço também para Donald Glover, que interpreta Lando Calrissian na perfeição. Joonas Suotamo vive por detrás da máscara reafirmando a sua posição de novo Chewbacca agora presente em mais uma era da saga. Emilia Clarke tenta dar o seu melhor para se destacar, acabando por ter algum grau de profundidade que fica por explorar, sendo que a sua relação com Solo nunca transparece mais do que um mero interesse romântico quase sem substância, mas com importância suficiente para que Han Solo deixe tudo na esperança do reencontro. Woody Harrelson assume a posição de velho mestre, embora a história introduza twists suficientes para podermos caracterizar a sua personagem em toda uma outra categoria sem sentirmos qualquer incomodo. O vilão, Dryden Vos, interpretado por Paul Bettany, é mais um vilão cliché mas bem executado. Não será certamente recordado por algum momento icónico, mas é uma ponte para toda uma outra perspectiva sobre os acontecimentos do filme.

Sobre a parte técnica, os efeitos especiais destacam-se pela qualidade já administrada pelas produções da Industrial Light & Magic, embora alguns momentos escalem para um registo digno de filme animado, especialmente numa cena em particular que será facilmente detectável pela audiência. A cinematografia de Bradford Young, responsável por Arrival Selma: A Marcha da Liberdade, dá também algum charme único a Solo, com alguma incidência nos cinzentos e castanhos, nunca deixando por isso de ser Star Wars. Um trabalho sublime, que deve ser analisado para lá do produto central do filme.

John Williams assina o tema principal de Solo, mas o resto da banda sonora fica encarregue a John Powell, com carreira em filmes como Shrek, Idade do Gelo, e  Como Treinares o Teu Dragão. Algumas das composições da trilha sonora são uma fantástica adição, outros são os momentos em que passa completamente despercebida. Mas o factor nostalgia ganha o dia quando ressuscita alguma da mestria de Williams. Há sem dúvida um Star Wars feel, o que significa que Powell acertou em cheio, embora não seja possível igualar o mestre. Mas quem conseguiria?

Solo: A Star Wars Story nunca conseguirá unir a fandom nem é o filme perfeito. Há certamente alguns pontos onde fica aquém, especialmente no que toca a profundidade da sua história. No entanto, fecha todos os arcos que interessam para a evolução dos seus protagonistas, deixando a great picture em aberto. A fita joga também pelo seguro, nunca apresentando qualquer tipo de entrave na sua relação com os outros filmes. Depois de Os Últimos Jedi parece-me que isso será bem aceite para os fãs mais puristas e não é sem dúvida um ponto negativo. No entanto, para aqueles que já embarcaram no barco do ódio à Disney, talvez seja demasiado tarde para desfrutarem desta nova adição. Fica, no entanto, expectativa suficiente para esperar pelo regresso de Alden Ehrenreich e Joonas Suotamo, uma vez que ficam por cobrir alguns dos anos que antecedem Uma Nova Esperança. Talvez não calhe a dupla, mas sim a um dos tantos filmes anunciados, com especial menção a um possível filme de Obi-Wan Kenobi, talvez a mais esperada História de Star Wars não anunciada…

7.5

Voltarei em breve com mais cinema…