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Crónica em Branco – I

Envolta na suavidade do roupão, mantido branco à custa de lavá-lo em separado na máquina com o detergente certo, pensava, com agrado, na ideia de ir almoçar fora com o namorado e, a partir dali, poder optar entre preferir voltar a casa ou, satisfazendo o desejo de requinte, ir em companhia dele, para um lugar discreto aonde pudessem livremente devorar uma caixa de bombons sortidos e abrir uma garrafa de espumante para festejar.

Era no propósito de provocá-lo, que os saboreava lentamente e se punha com os dedos a alisar a prata, com se pudesse embrulharia as dezenas de beijos que tinha vontade de lhe dar.

Sacudindo a cabeça, despendeu o cabelo que tinha enrolado na toalha de banho ainda húmida. Deu um passo para o lado e perfilou-se diante do espelho do armário da casa de banho, Viu-se na necessidade de ter de desembaciá-lo com a mão espalmada, para diferenciar do seu, o rosto baço de olhar enevoado que tinha pela frente.

Era agradável vê-la ao natural, a face rosada, emoldurada pelo cabelo de corte adequado ao formato do rosto. Comprido, ela gostava de desembaraçá-lo suavemente das raízes às pontas, como quando o hidratava e friccionava o couro, como se fosse aí o ponto nevrálgico onde mais prazer sentia quando era massajada.

A caminho dos 50, era, sob todos os pontos de vista, uma mulher realizada. Num pulinho, atingira a fasquia 30; superara a barreira dos 40, como uma atleta numa prova de obstáculos imparável a caminho da meta; e sem escapar à linguagem, a despeito de já não ter 20 anos, poder-se-ia dizer que se exibia em tão boa forma física como um futebolista que aos 35 ainda ambiciona ganhar uma Bola de Ouro. Nada nela chamava a atenção para o facto de se aproximar dos 50, mas como se os anos não passassem ou passassem incompletos; aos anos faltassem meses; aos meses, semanas e às semanas, dias.

Não era alta, mas sabia que, para lá do que a vista não alcançava, podia desfrutar dum amor tão intenso que não estava ao alcance de qualquer mulher. A imagem da doçura era o olhar. Os olhos eram castanhos e cada piscadela correspondia ao número de vezes que, ao longo do dia, à distância, ao namorado apetecia estar com ela. O sorriso era abrangente e capaz de reconciliar com a vida, até quem de alguma forma já sofrera dos males de amor.

Despiu o robe, deixando à mostra o pijama e estremeceu pensando na sensação que teria caso tivesse sido o namorado a tirar-lho. De tecido felpudo, aparentava ser quente, mas não tanto como a ideia que daria se em vez de branco fosse vermelho ou laranja.

À altura da cabeça, havia uma prateleira que servia de suporte a diversos frasquinhos de perfume de diferentes cores e formatos, embora pequenos, do tamanho ideal para caberem a par do telemóvel, na pequenina bolsa que costuma acompanhá-la para todo o lado. Num deles, de forma triangular, colocada a servir de tampa, uma figura feminina da mitologia grega, evocava o direito, a que toda a mulher devia reivindicar, de ser bajulada por um homem, mal a visse quando saísse de casa.

Depois, como se de um segredo se tratasse, entrou no quarto às escuras e dirigiu-se à gaveta da mesa-de-cabeceira onde guardava peças de vestuário íntimo. Aí, estavam dezenas de conjuntos no meio de peças desirmanadas, de cuecas e soutiens de diversas cores e feitios, com que não se importaria de só andar vestida, se tivesse tido a sorte de nascer num país de temperatura elevada constante, aonde fosse verão todo o ano.

Os mais ousados eram nas tonalidades de branco, vermelho e preto. Rendilhados, eram como peças de filigrana com desenhos bordados à mão. Peças exclusivas em cujo padrão ressaltavam formas inspiradas no seu corpo curvilíneo. Guardava na gaveta de baixo, quase todos em tom beije, os modelos de menor inspiração concebidos para usar no dia-a-dia. Mais discretos, apoiavam-se no facto de terem a cueca subida e estarem de rendas, mas nem por isso estava menos patente o bom gosto de quem os comprava. Tinha-os ao lado dos collants, dos mais simples aos mais sofisticados, publicitados na televisão, que não vestia a não ser em ocasiões especiais, como quando saía com o namorado, talvez por achar que eram os que mais se lhe colavam às pernas e, só por essa razão, precisar da sua colaboração inestimável na hora de os despir.

Não precisou de andar a tatear, para encontrar os que mais lhe convinham. De seguida, levantou os estores e com a janela fechada perscrutou a rua à procura de algum sinal. Calculou que fossem umas 10 horas. Em todo o seu esplendor, o rei sol iluminava a fachada do prédio de nove andares em frente, aonde ela não se ralaria se tivesse de morar, desde que, acompanhando o movimento giratório da Terra, ele lá continuasse a bater, aquecendo da forma de que mais gostava os dois quartos e a sala.

Caídas do arvoredo, viu dezenas de folhas espalhadas no passeio, como se aí tivessem sido plantadas pela ventania da véspera. Prontamente achou que não valeria a pena pentear-se, se era para ficar como se tivesse consequências à superfície, o turbilhão de fantasias sugeridas pelo cérebro, acerca da forma como desejava que a tarde se passasse.

Despiu-se e acariciou suavemente os seios, não pondo obstáculos à mão descer até uma zona em redor da qual era suposto ele mexer na altura de ajudá-la a tirar os collants. Conhecia de antemão, a necessidade subjacente ao desejo de repetir as emoções dum primeiro encontro. E o seu aconteceu numa noite gélida de sábado, numa época em que, nem ela tinha dinheiro para comprar lingerie de luxo, nem ele para comprar um gel ou vaselina que atenuasse o desconforto de terem de fazer amos em modo de segurança, ou seja, com dois preservativos enfiados ao mesmo tempo.

Apesar da inexperiência inerente aos 19 anos, contava proporcionar-lhe prazer e arrancar de si, nem que fosse o gemido sentido de um orgasmo duplo na forma tentada. Era inverno e após muito pensar, resolveram sair de casa e ir no carro dela, um Peugeot modelo 205 de traseira amolgada, para uma zona de mato desordenado, na orla de uma praia a caminho de Sesimbra, a uma hora tardia em que só encontrariam algum banhista se, ao acaso, desconfiasse que escondido nas dunas poderia divertir-se presenciando a cena tórrida que estava prestes a começar.

Tímida, levantou o pulôver e desabotoou a blusa, quando o namorado, espraiando a mão, começou a esfregá-la vigorosamente como se pudesse alisar-lhe o peito, que, em sinal contrário, parecia estar cada vez maior.

Numa reviravolta de 180 graus, viu-se repentinamente com ele no banco traseiro do automóvel, a olhar para a rua, para onde achou que deveriam ter ido para poder mexer-se mais à vontade. E tanto mexeu, que, não percebendo já de que lado do carro é que estava, se dentro se fora, enveredou pelo caminho irreversível que conduz o casal a um estado de felicidade plena, soltando no final um gemido que, não fosse terem saído, escutá-lo-iam os pais que àquela hora estariam deitados no quarto que ficava mesmo ao lado do seu.

Não era o momento adequado para dormir, mas após o esforço a pobre sentiu-se tão esgotada fisicamente, que não se importaria de dormir no regresso a casa, confiando-lhe a condução do automóvel, não tivesse o receio talvez infundado de saber que o namorado tinha sido aprovado no exame de condução há menos de 2 meses.

Nesse dia, ao almoço, insinuar-se-lhe-ia, disposta a que o dia e a noite terminassem aonde e como o namorado entendesse. Na penumbra dum quarto de motel ou às claras, numa praia recôndita, porque a noite anunciava-se de lua cheia e não havia absolutamente nada que ela tivesse vontade de lhe esconder.

FIM