De Perder a Fé na Humanidade – Carla Vieira

Hoje vou falar para as crianças. Suponho que não haja muita criançada para aí interessada em ler o que tenho a dizer, nem o meu público-alvo são os de parca idade, mas hoje façam o esforço porque vai valer a pena. As crianças têm o dom de poderem dizer tudo o que lhes vem à cabeça sem usarem o filtro da boa-educação que a sociedade lhes implanta quando chegam a uma certa idade.

Se virem uma pessoa feia no autocarro, vão dizer que essa pessoa é feia. Algumas pessoas pensarão que é uma coisa que não se faz e explicarão à criança que não se deve dizer esse tipo de coisas para poupar os sentimentos das pessoas. Aposto que a maioria pensa assim, não é? “Que coisa horrível de se dizer, isso não se diz!”, e quando a criança pergunta porquê naquele ar inocente, a resposta pronta é porque obviamente estamos a magoar os sentimentos de alguém.

Até aí tudo bem, mas vamos pensar um bocadinho neste dilema, pode ser?


Quando uma criança diz alguma coisa que possa ser considerada “estúpida” (seja por falta de conhecimento ou tacto), é preciso lembrar que nesta mentalidade inocente, é quase impossível uma criança dizer alguma coisa a alguém com o intuito de ferir susceptibilidades, certo? A não ser que seja um piolho mal-amanhado, mas não me estou a referir a essas estranhezas. Neste aspecto, significa isto que se alguém se sentisse ofendido, temos que ter em conta que não seria culpa da criança mas sim da pessoa em questão. Então digam-me, seriam capazes de gritar a essa criança e chamar-lhe nomes ou diminui-la de qualquer forma só porque algo que lhe saiu da boca acabou por se revelar errado?

Não, pois não? A atitude normal que um adulto teria era explicar e educar a pequenada em questão acerca do assunto tratado. É assim que as coisas são ou deveriam ser, mas por algum motivo alheio à minha pessoa, pelos vistos agora a falta de compreensão é motivo para se ser insultado e diminuído de várias maneiras que nem vou mencionar sequer.

Acho que aí quem recorre a tamanha estupidez é que realmente só pode ser criança. E são estas crianças – sim, adultos formados mas com mentalidade de puto – as pessoas de quem estou a falar hoje, e que me fazem perder a fé na humanidade a cada dia que passa.

Por hoje é tudo, até para a semana.

Crónica de Carla Vieira
Foco de Lente