Desejos mortais de Natal

Depois de se tornar num Serial killer para salvar o espírito natalício – episódio relatado no passado ano:

Que pena… era um velhote tão simpático

– o Pai Natal pensou durante 365 dias na melhor forma de evitar novo massacre. Era seu entender, que o medo não poderia ser o melhor catalisador para esta quadra ser idêntica ao que foi outrora. Ele queria algo que fosse mais, mais qualquer coisa, mais autêntico. Pensou, pensou, e lá chegou a uma conclusão. Este ano, toda a gente iria receber exactamente aquilo que desejasse mais na altura. Pediu à doutorada em física quântica Rena Rodolfo para fazer os cálculos que trariam mais felicidade a cada um dos membros duma família já de si feliz.

Depois de alguns meses de aturada pesquisa, o processo estava em fase de experimentação. O que quer dizer que a família estava escolhida para testar este novo modelo de Natal.

E é aqui que entram na história os avós maternos de Diogo, treze anos, Carminda e António, os paternos, Luís Gonçalves de Almeida e Josefina de Almeida, os filhos de ambos os casais, Maria, Catarina, Feliciano, os respectivos conjugues, Alfredo, Carlos e Madalena.

Uma verdadeira família feliz, onde não faltava a feliz mesa de natal, a feliz árvore de natal, e o também não menos feliz sorriso estampado na cara de todos na presença de tão desejada companhia.

E tudo começou bem, para gáudio do Pai Natal,  à mesa, Carminda elogiava a forma como o bacalhau lascava, Luís ouvia com atento regozijo António enquanto este lhe falava das valências do seu novo automóvel. A outra geração falava das suas vidas de sonho, Maria dizia que iria ser promovida, Catarina que iria ter novo filho, Feliciano que não iria mais trabalhar para os outros, numa sucessão interminável de sorrisos realizados.

Todos tinham algo para dizer, todos tinham algo para desfrutar, todos tinham algo para ofertar.

E por falar em ofertas, tinha chegado a hora das prendas, toda a gente se perfilava num gesto único para abri-las e encontrar lá o que mais desejavam.

Mas nenhuma das prendas abertas tinha algo lá dentro, estavam vazias, e nem o Pai Natal percebeu o porquê, ficando a olhar para Rodolfo, e Rodolfo a olhar para ele. E mais confusos ficaram quando Carminda, António, Luís Gonçalves de Almeida, Josefina de Almeida, Maria, Catarina, Feliciano, Alfredo e Madalena caíram no chão falecidos.

“Que é que se passou?”, perguntou preocupado o Pai Natal.

“Nada, os meus cálculos mostram que o sistema resultou. Eles deviam estar felizes com as prendas.”, respondeu-lhe a famosa Rena.

“Mas que prendas?”, questionou novamente o velhinho das barbas brancas.

Depois de algum tempo reunidas, entre equações de elevada complexidade, a equipa de Renas quânticas chegaram à seguinte conclusão: o desejo de Carminda era que a comadre Josefina falecesse, a do seu genro era que ela mesmo tivesse o mesmo fim, já ele morreu porque o sogro assim o desejou profundamente, Maria já estava farta da conversa dos filhos de Carminda, esta sentia raiva da sua posição empresarial, e as duas assassinaram-se mutuamente assim, e assim, numa sucessão de desejos profundos este Natal acabou mais uma vez com um pensativo Pai Natal, e com uma família de cadáveres.

Mas houve um sobrevivente, Diogo. E Diogo ouviu a campainha, e Diogo teve o que desejava, a Miss Playboy do mês de Dezembro. Perde-se uma família, ganha-se em chavascal… mas misteriosos são os caminhos do Senhor!