Será assim tão mau ser-se solitário?

Ao longo da minha vida fui vivenciando várias situações. Umas melhores, outras menos boas, mas todas elas deixaram marca na minha pessoa — mesmo que tenha sido apenas uma ligeira celeuma ou algo que, por vezes, nem possa ser considerado como um atrito. Mas todas elas ficaram impressas em mim e foram influenciando a forma como sou e, principalmente, como vou olhando para a vida. Muitas tristezas — e algumas felicidades —, vão-nos modificando tal como a passagem das estações vão alterando a Mãe Natureza.

Já presenciei nascimentos que trouxeram imensa alegria a toda uma família. E, infelizmente, também já perdi familiares e amigos nesta vida. Amigos que cresceram comigo e que, de uma forma totalmente impotente da minha parte, vi partir sem os ver a concretizar nenhum dos seus sonhos de criança. Mas o tempo não pára. Os dias vão nascendo e os anos vão avançando a uma velocidade vertiginosa. E, ao longo da vida, vamos tirando as nossas próprias ilações de tudo e de todos.

E as minhas ilações acabam todas por resultar numa quase certeza: as pessoas não prestam. O ser humano consegue ser muito bom, mas quando quer ser malévolo, aí nem precisa de se esforçar em comparação com o esforço de tentar ser bom. Ser-se malicioso, é fácil. Ser-se uma boa pessoa, é quase sempre uma miragem — até porque, muito provavelmente, ninguém consegue ser cem por cento boa pessoa. O mundo foi mudando ao longo dos anos, e as pessoas foram mudando igualmente com ele — não necessariamente para melhor.

Já se passaram guerras (uma continua em grande escala e sem fim à vista), terrorismo aliado a atentados, e pandemias que transformaram as pessoas e o seu comportamento para com outras pessoas. Longe vão os tempos onde podíamos contar com outros seres humanos sem esperar que tivesse sempre de existir uma espécie de troca de bondade e de acção. As pessoas metamorfosearam-se em seres mentirosos, falsos, interesseiros, desonestos e capazes das maiores atrocidades em beneficio próprio. Não há a bondade ou ajuda sincera. Há sim — e isso é experienciado por mim todos os dias — pessoas que fazem algo com o intuito de receber algo em troca em proporções maiores em comparação com o que ofereceram.

E tudo isto leva-me a concluir que, efectivamente, começo a não saber lidar com outras pessoas sem que eu próprio fique desconfiado. Estou cansado de lidar com pessoas e farto de lidar com a falsidade que nos rodeia todos os dias. Os anos foram-me ensinando que não devo confiar em demasia, pois posso ser facilmente magoado. Que não devo ajudar as outras pessoas como sempre me senti bem em o fazer, porque corro o risco de ser pretensioso e interesseiro e querer algo mais em troca.

E é por tudo isto que, efectivamente, todos os dias me vou afastando mais das pessoas. O meu mundo funciona com a minha família e alguns amigos ao meu redor. Tudo o resto passou a ser ruído — ruído esse que é facilmente eliminado, bastando apenas não me apegar e não me preocupar.

As pessoas cansam-me. O mundo agasta-me. Se calhar, até nem é assim tão mau ser-se uma pessoa solitária…