Uma Lufada de Ar Pesado

Sente-se qualquer coisa no ar não é? Bem, sente-se frio, e isso é óbvio, mas também sente-se um certo odor estranho. Digo, antes de mais, que não é culpa minha, tomei banho hoje! Porém o cheiro do armário da minha bisavó é muito parecido com o que se sente. Parece bafio ou que é, não é?

Confere, é bafio! É bafio, como aquele cotão na barriga dos gordos. É bafio como quando usamos aquela camisola que comprámos há 10 anos, e ficou no armário desde então. É bafio como eleger um Presidente da República tão diferente do anterior, que parece ser exatamente o mesmo. É bafio como quando se come o mesmo pão que compramos há já uma semana. É bafio.

Não estou a falar do fogo de vista, que é a imagem de “tio sabichão”, que transpareceu durante anos ao Domingo à noite. Estou a falar das fotos com Marcelo Caetano, da “vichyssoise”, das declarações sobre uma piada do Herman, etc.

E no ar, hoje, sente-se o mesmíssimo cheiro que se sentia há dois dias. Cheiro a Cavaco. Cheiro a mais do mesmo. O ar continua pesado. O Cavaco está com ar pesado. O próprio Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, aos saltinhos ao lado do Professor Marcelo, no concerto do Pedro Abrunhosa, estava com um ar pesado. O ar está pesado.

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Trata-se então de uma nova expressão, “uma lufada de ar pesado”, é então aquilo que se sente quando temos uma ideia de futuro e nos brindam com o passado. Gosto de me imaginar nas ruas que atravessam Lisboa, na zona entre o Rato e Belém, passando pelo Quartel do Carmo, no dia 25 de Abril de ’74. Gostava de lá estar para sentir a esperança que se sentiu nesse dia, e nos restantes. Gostava de ver todos aqueles Lisboetas de cara lavada de lágrimas, de saber que aqueles que estavam por Guerras Ultramarinas, estavam prestes a voltar aos seus braços. Gostava de ver a cara daqueles, que lá se perderam, se vissem os familiares, amigos e amores, perdidos de esperança que alegrava qualquer um. Gostava ainda mais que não fosse preciso eles terem ido para lá.

Mas isso foi história, e temos de nos lembrar ainda do Verão Quente, do 25 de Novembro e de personagens como o Cónego de Melo e a sua escumalha – que até conta com uma estátua em Braga, o que é lisonjeiro para um terrorista – ou outros grupos como o LUAR ou a Legião Vermelha – e pelo menos aqui o Tomás de Aquino não tem uma estátua – foram já tormento o suficiente, por isso compreendo que a Democracia a partir de ’76 tenha sido uma lufada de ar fresco. A partir daí, sempre mais do mesmo.

Livre de mim comparar a eleição de Marcelo Rebelo de Sousa com o que se sentiu naquela época, porém, gostava de sentir o que eles sentiram no fim de tudo aquilo. Marcelo parece ser só mais um. Merecia ser, e sentir-se, como “aquele” que todos nós seguimos, mas não sei se pelo pouco poder do Presidente, se pela última experiência que tivemos com Cavaco, parece que ninguém quer saber do cidadão que vai ocupar o Palácio de Belém. A verdade é que tanto ele merecia mais, e sentir-se como “o escolhido”, como eu merecia mais e sentir esperança. Nenhum dos dois tem aquilo que merece.

Olhando para o mundo que nos rodeia, e usando as redes sociais como exemplo, se calhar talvez a maior parte das pessoas não merecesse mais do que o que já tem. Dia-a-dia, hora-a-hora invadem Facebooks e Twitters, imagens daqueles que pedem sangue! Por tudo e por nada. Hoje, numa comunidade de partilha de ideias, vi uma insana série de imagens que sugeriam pena de morte a “todos os políticos corruptos”. Já tratei deste tema antes, neste mesmo local, mas ainda não consegui tratar de mim, naquilo que diz respeito a conseguir compreender que muita gente não tem noção do que Democracia é, e que não basta ter uma ou duas declarações polémicas para ser digno de nota.

Há uns tempos Ricardo Araújo Pereira disse “ainda bem que existe liberdade de expressão, caso contrário, os idiotas ficavam de boca fechada e nunca saberíamos que eram idiotas!” Certo, e eu próprio, para alguns, sou um idiota, e ainda bem que assim é. Mas honestamente, a idiotice de outros, já me começa a chatear. É um bocado como as pessoas que partilham imagens a dizer “As mulheres Sportinguistas/Portistas/Benfiquistas/do Diabo que as transe não são princesas, são rainhas!” Desculpem lá, mas não vos consigo respeitar.

O tipo de pessoas que hoje pede o sangue de quem quer que seja, por “corrupção”, são os mesmos que não param em todos os STOP que encontram. Fazem, portanto, figura de parvos. Como o Fernando Mendes faria, caso fosse júri num concurso de dietéticos. Não fazem sentido. Talvez fossem felizes num país onde na vez de Marcelo estivesse Donald Trump. Mas por favor, que esse mundo não seja o mesmo em que eu vivo.

Até lá, prometo ir tirando a tensão ao ar. É que tanto é o peso do pobre coitado, que deve estar prestes a ter uma crise de colesterol.